sábado, 23 de junho de 2012

O homem de metal e a mulher numa caixa de vidro


Esta é a história de Zeferino Xavier de Almeida, contra-almirante da Marinha Portuguesa e prolífico inventor do século XIX, vítima trágica dos segredos escondidos abaixo das ondas do mar.

Zeferino era um homem inteligente, dedicado às ciências e apaixonado pelo conhecimento. Mas era, ao mesmo tempo, um homem de acção que amava a vida no mar quase tanto quanto amava a sua mulher, Maria Helena. Na sua função de contra-almirante, era admirado pelos homens que o serviam e respeitado pelos seus superiores, não só pela sua perícia e coragem, mas também pela sua capacidade intelectual e hombridade.

Quando estava de licença, Zeferino gostava de levar Maria Helena a velejar. Abordavam o pequeno veleiro que tinham atracado no porto de Lisboa e partiam só os dois em longos passeios ao longo da costa. A vida corria bem ao contra-almirante e à sua esposa. Até que, certo dia, numa altura em que o clima estava especialmente calmo, algo se passou num passeio junto à costa do Estoril.

Zeferino foi encontrado numa praia, sozinho, ferido, quase afogado e com as roupas rasgadas. De Maria Helena, não havia sinal.

Ninguém percebia como teria sido possível terem naufragado num dia como aquele e o relato oferecido pelo oficial não satisfazia as autoridades que começavam a desconfiar de actividade criminosa. Mais concretamente de homicídio, levado a cabo por uma mente claramente perturbada: a de Zeferino.

Segundo o náufrago, o barco tinha sido atingido por algo de proporções colossais, um vulto na água que sacudiu a embarcação de forma violenta, fazendo Zeferino e Maria Helena cair no convés. Ao segundo embate, grandes pedaços do casco foram projectados no ar numa enorme coluna de água acompanhada por um cheiro fétido e nauseabundo. De imediato, o mar invadiu o interior da embarcação através do casco destruído, levando-a a inclinar-se perigosamente a bombordo.

O casal tentou manter-se agarrado ao convés e à vida, mas não havia nada a fazer. Em menos de nada, todo o navio estava submerso. Zeferino e Maria Helena sacudiam os pés freneticamente, não só para se manterem à tona de água, mas também numa tentativa inútil de afastar a criatura que eles sentiam a mover-se na escuridão das profundezas.

Naturalmente, ao ouvir este relato, os investigadores e os médicos estavam já convencidos de que o contra-almirante tinha perdido a razão. A sua mente fora certamente apoderada pela loucura. Mas a narrativa ainda não tinha terminado. Mesmo percebendo que a verdade era demasiado assustadora para que alguém acreditasse nela, Zeferino continuou a sua terrível descrição.

Combatendo o pânico, Zeferino e Maria Helena procuraram agarrar-se aos destroços que ainda boiavam à sua volta. No entanto, esse esforço foi em vão. De repente, tanto o oficial como a sua amada sentiram os seus pés a serem agarrados e foram sugados para o abismo.

Dentro de água, enquanto lutava para se libertar, Zeferino conseguiu ver que o que o agarrava era na verdade um "homem" sem pelo, com grandes olhos negros e uma boca assustadoramente larga, atrás da qual se adivinhava uma fileira de dentes afiados. A alguns metros de si, Maria Helena era também puxada por dois destes homens-peixe que a tentavam colocar dentro de uma estranha caixa de vidro.

Mais longe, viu ainda um enorme polvo a afastar-se e, atrás dele, algo que fez Zeferino gritar e perder todo o ar que tinha nos pulmões. Não era possível, mas ali estava. Entre as rochas no fundo do mar, brilhavam e cintilavam as luzes de uma enorme cidade submersa... e viva.

Sem oxigénio, Zeferino acabou por perder os sentidos e só voltou a recuperá-los quando já se encontrava no hospital.

Se por um lado as autoridades não acreditavam na história mirabolante do contra-almirante, por outro não tinham quaisquer provas para o condenar. Zeferino foi liberto e rapidamente afastado das suas funções de oficial.

Mas ele não queria saber da Marinha. Tudo o que lhe interessava agora era encontrar aquela cidade no fundo do mar e recuperar Maria Helena das garras dos homens-peixe.

Durante meses, fechou-se numa oficina que comprara junto ao Tejo e só de lá saiu quando a sua obra estava terminada. Todos lhe chamaram de louco, mas Zeferino não hesitou e lançou-se ao mar na sua mais recente invenção: um submarino com escafandro, devidamente equipado para fazer frente a qualquer monstro das profundezas.

Foi numa manhã ventosa que Zeferino se fez ao mar. Uma pequena multidão de curiosos assistiu à sua partida, observando a peculiar embarcação desaparecer gradualmente na espuma das ondas.

Nunca mais alguém o viu.

No entanto, ainda hoje surgem relatos de marinheiros que vêm estranhas luzes na água junto à costa do Estoril. Muitos desses marinheiros admitem também terem sido assombrados por incríveis sonhos sobre o fundo do mar. Sonhos sobre um homem em feroz batalha contra as hostes do abismo. Sonhos sobre um homem de metal e uma mulher numa caixa de vidro.

1 comentário:

Brumo Gomas disse...

eheheh
gostei!
boa-cola, boa-cola, uh-uh!