terça-feira, 31 de julho de 2012

Manel e a conspiração dos peixes, 1ª parte


Ontem comi carapaus ao jantar e, como é hábito, trinquei e cravei nas gengivas uma dose considerável de espinhas. Por muito que esgravate o peixe antes de meter uma garfada à boca, não há maneira de me livrar daquelas navalhas de esqueleto marinho perfeitamente camufladas no meio da carninha suculenta.

No entanto, farto-me de ver outras pessoas a comer peixe sem se queixarem. Passam com a faca aqui (zip), passam com a faca ali (zup), afastam as espinhas dorsais (zup-tic), separam metade do peixe num movimento único e fluído (zip-plec) e procedem a ingerir o dito cujo com enormes garfadas absolutamente livres de espinhas (gulp, naturalmente) . Eu, por outro lado, acabo sempre em batalhas dignas de um documentário da National Geographic, a debater-me com autênticas adagas que tentam chegar ao meu cérebro através do céu da boca.

Parece-me, portanto, que existe uma conspiração contra mim. Os peixes estão decididos a tramar-me, mesmo depois de mortos!

Ao chegar a esta conclusão cuja veracidade é evidente e inabalável, decidi pesquisar as razões que levaram a tão maquiavélico plano. Para isso, desloquei-me à Biblioteca Esquecida dos Assuntos Submersos (que só é acessível através da ponte de raios de sol que aparece em Lisboa ao final do dia) e pedi ao Sr. Eliseu, bibliotecário extraordinário, toda a informação que tivesse sobre peixes e espinhas.

A Biblioteca Esquecida dos Assuntos Submersos é um lugar vasto onde estão arquivados todos os segredos esquecidos nas profundezas dos oceanos. É lá que estão guardados os ossos do primeiro Kraken e os restos ferrugentos de vários navios desaparecidos no Triângulo das Bermudas. É lá que estão os pergaminhos da biblioteca da Atlântida e os escafandros do Nautilus. Nas minhas visitas aos corredores da biblioteca é frequente encontrar por lá muita gente curiosa, como o Tritão, que invariavelmente tenta convencer o Sr. Eliseu a não pagar multa por entregar livros em atraso, ou a ninfa Loreley, que insiste em cantar "I am a rock", de Simon e Garfunkel, (o que naturalmente não é muito bem visto pelo Sr. Eliseu e os restantes visitantes) enquanto lê livros sobre naufrágios nos rios da Alemanha.

Estou a dispersar.

Atendendo ao meu pedido, o Sr. Eliseu, bibliotecário extraordinário, trouxe-me vários volumes sobre o assunto desejado. Foi aí que descobri a verdade sobre a conspiração dos peixes...

Mas o resto da história fica para amanhã. Este texto já está muito longo e tenho mais que fazer.

Até amanhã.

(Nota, 1 de Agosto: Já podem ler a conclusão aqui.)

sexta-feira, 27 de julho de 2012

"M"


Com esta coisa de começar a escrever contos associados às fotos, acabei por me entalar. Agora fico a achar que é poucochinho quando só publico fotografias e não escrevo nada.

Mas para escrever preciso de ter a cachimónia desimpedida durante um bocadinho e hoje não estou a conseguir.

Por isso, é desta que vos deixo mesmo só com a foto do dia.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

O homem que tinha uma história, mas não conseguia contá-la

Estive quase para deixar-vos apenas com uma foto e não escrever nada hoje.

Mas depois lembrei-me:

Era uma vez um homem que tinha uma história, mas não conseguia contá-la.

Já tinha tentado de várias maneiras, mas sempre que se esforçava por dizer ou escrever as palavras que a compunham, elas recusavam-se a sair da sua cabeça.

O homem que tinha uma história ficava horas sentado em frente ao ecrã do computador ou de lápis apoiado no caderno aberto sem conseguir escrever uma única palavra. Ao fim de alguns minutos a olhar para o cursor a piscar ou para o vácuo infinito de uma folha em branco, os seus olhos deixavam de focar e a sua mente ficava igualmente vazia.

- És feliz? - Perguntou um amigo a quem o homem tinha explicado o seu problema.

- Feliz? Sim, acho que sou. Porquê?

- Então? Nunca ouviste dizer que as pessoas felizes não têm histórias para contar? Se calhar o que precisas é de ser um bocadinho triste. Sabes, essa coisa da felicidade é muito sobrevalorizada.

- Bom, a verdade é que já me afeiçoei bastante à minha... - Respondeu o homem com alguma hesitação - Além disso, o problema é que eu tenho mesmo uma história para contar. Só que ela não sai cá para fora. É como se tivesse uma vozinha na minha cabeça a dizer "Nã, nã. Daqui não saio, daqui ninguém me tira".

- Hm... Então o caso é bicudo... Já experimentaste falar com ela?

- Com quem?

- Com a história.

- Falar com a hist...

- Exacto. Se tens vozes na cabeça, parece-me que o melhor é dialogares com elas. "Tudo é possível através do diálogo", já dizia a minha avó.

A ideia parecia absurda, mas que escolha tinha o homem que tinha uma história? Umas horas mais tarde, quando chegou a casa, sentou-se no sofá da sala durante um bocadinho e esperou um pouco até ganhar coragem para falar com a sua própria cabeça.

- Er... História? - Perguntou ao vazio entre paredes - Estás aí?

- Estou, estou. 'Qué que queres, pá? - Respondeu uma voz vinda de lado nenhum.

- Ah! Xiça!... - Gritou o homem, assustado por uma resposta que não esperava ouvir - Desta não estava à espera...

- Sim, sim. Vá, desembucha lá. Qué que foi?

- Bom... er... sabes... bem, queria... queria perguntar-te porque é que não te deixas ser contada.

- Oh. Porque não me apetece. Sei lá.... Olha, porque preferia ser um épico! Preferia ser um livro de quinhentas páginas, com batalhas espectaculares, um romance escaldante, actos imensamente heróicos e mortes trágicas capazes de fazer chorar o Darth Vader ou a Angela Merkel.

- Mas assim deixavas de ser tu. Se eu escrever um épico, já não te escrevo a ti.

- Pois, está bem. Mas porque é que não escreves como o Tolstoi? Ou o Tolkien? Ou até como a Marion Zimmer Bradley?

- Mais uma vez, porque se o fizesse já não estaria a escrever-te a ti. E agora não quero escrever outra história. Vá lá, há tantas histórias curtas maravilhosas. Olha, os "Contos dos Subúrbios" do Shaun Tan, por exemplo. Há poucas coisas melhores do que aquilo.

- Prontos, tá bem. Tens razão. Estava só a sentir-me um bocadinho insegura. Vamos lá então.

Depois desta conversa, o homem que tinha uma história para contar sentou-se à secretária e contou a história que tinha para contar. Era uma história pequena, com pouco menos de duas páginas, mas o homem que tinha contado uma história estava contente.


Muitas pessoas leram o que ele escreveu. Umas gostaram, outras nem por isso. Mas, para as pessoas que gostaram, a extensão diminuta da história era perfeita, porque assim era mais fácil contá-la a outras pessoas que por sua vez contavam a outras. E a outras. E a outras.

Vários anos mais tarde, um velhinho sentou-se nas escadas do jardim (como fazia todos os dias) para contar uma história aos miúdos que por lá passavam. Desta vez, escolheu uma história chamada "O homem que tinha uma história, mas não conseguia contá-la".

quarta-feira, 25 de julho de 2012

Rabiscos ao calhas, #15

Há já muito tempo que não publicava "Rabiscos ao Calhas" aqui no blogue (o último foi em Dezembro do ano passado). Algo que  se deve ao facto de não desenhar há já muito tempo.

Este saiu-me dos dedos enquanto assistia a um episódio de uma série de ficção-cientifica. O desenho não tem nada a ver com a série, mas parece-me que tem a ver com a história "O homem de metal e a mulher numa caixa de vidro" que publiquei aqui em Junho. Escrevo "parece" porque o desenho foi aparecendo no papel sem que eu lhe desse muita atenção.

Pensando bem nisso, acho que a grande maioria dos meus desenhos foram feitos quando estava distraído com outra coisa qualquer. Se calhar é esse o segredo para voltar a desenhar: não pensar muito no assunto e só desenhar quando estou distraído.

sexta-feira, 20 de julho de 2012

O jardim secreto do Sr. Jacinto

O Sr. Jacinto era um homem triste e cinzento que vivia numa cidade triste e cinzenta.

Há já muitos anos que o último jardim daquela capital tinha sido destruído para dar espaço a um enorme centro comercial para o qual a população afluiu como formigas à caça de migalhas de bolo no final de uma festa de anos. Porque já não existiam árvores na cidade, este e as restantes centenas de centros comerciais da zona tinham de ser abastecidos com ar fresco importado de outras regiões do mundo. No entanto, diziam os especialistas, era tudo pelo bem da economia.

Para o Sr. Jacinto, nada disto fazia sentido e mantinha em sua casa uma sala repleta de vasos de plantas que tratava com carinho e admiração. Entre as flores, encontravam-se orquídeas, margaridas, celósias, astromeias, cravos e uma enorme estrelícia. Entre as árvores de pequeno porte havia  vários bonsai, uma nespereira, uma árvore de pomelo e um limoeiro. No seu pequeno jardim, Jacinto tinha também salsa, manjericão, tomate, cenouras e alface.

A existência do refúgio verdejante não era segredo para os seus vizinhos, mas não era visto com bons olhos:

- Quem acha ele que é? - Questionava o queixoso do rés-do-chão (tão queixoso que só podia viver em pisos térreos porque as escadas não aguentavam tanto queixume) - Andamos nós a trabalhar para o bem da economia e vem este tipo plantar as suas próprias melancias!

- De facto. A conduta indesejável do cavalheiro nosso propínquo é deveras ignóbil. - Respondia o pseudo-intelectual do 3º (tão pseudo que só lia clássicos com mais de 500 páginas e que tivessem sido escritos há mais de 200 anos) - O consumo de produtos produzidos em ambiente privado controlado não é propício ao trânsito quimérico de bens e valores que é imperativo para a prevalência de uma economia salutar. "O dinheiro é o único poder que não se discute", já dizia Alexandre Dumas.

- Err... Pois... Isso. E ainda por cima não faz o dinheiro circular! - Concluía o queixoso.

- Foi isso que eu disse.

- Ah foi?

- Foi.

- Ah.... Prontos.

E voltavam os dois para as suas vidas cinzentas, nos seus apartamentos cinzentos, num prédio cinzento da capital cinzenta.

Certo dia, a informação de que ainda existia um pouco de verde na cidade chegou aos directores de uma qualquer agência governamental de protecção do consumidor. Naturalmente, não tardou muito para que a casa do Sr. Jacinto fosse invadida por uma equipa de intervenção composta por 10 homens totalmente equipados e armados até aos dentes.

Em menos de nada, todas as plantas do Sr. Jacinto tinham voado pela janela da sala "pelo bem da saúde pública e no interesse do combate à economia paralela".

Deixado sozinho no rescaldo da invasão domiciliária, Jacinto olhava embasbacado para a parede onde antes estava a plantação vertical de tomate. Sem que tivessem dado por isso, a equipa de intervenção tinha revelado algo que ele nunca tinha visto antes.

Na parede desnudada estava agora uma pequena janela de caixilho branco.

E do outro lado, um enorme jardim de mil cores estendia-se até perder de vista.

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Frutaria aos quadradinhos

Tirei estas no interior da frutaria perto de minha casa.

Já tinha reparado, quando passei por lá há alguns dias, que o sol projecta no chão as letras coladas no vidro da montra, mas não tinha a máquina comigo. Fiz questão de a ter comigo quando lá voltei para conseguir fotografar o fenómeno e... voilá!



quarta-feira, 18 de julho de 2012

Sessão de fotos no Castelo de São Jorge

Hoje vou fazer um pouco de batota e não vou cumprir as minhas próprias regras. Estas fotos foram tiradas há mais de três dias, mas não queria deixar de publicá-las no blogue.

Para ir a uma entrevista a uma agência de actores, a minha Inês tem de levar um DVD com fotos. Como fotógrafo de serviço do nosso agregado familiar, calhou-me a missão de "tirar os bonecos".

Para isso, fomos para o Castelo de São Jorge à tardinha. Em termos de luz há poucos sítios em Lisboa como o castelo. Num espaço bastante reduzido temos locais com muita luz, locais com sombras, locais com sombra e luz ao mesmo tempo (por causa das árvores), temos cenários variados (cidade ao longe, ameias do castelo, árvores, túneis, escadas, relva, etc., etc., etc.) e, acima de tudo, um ambiente tranquilo, com poucas pessoas e pouco ruído.

Estas imagens são apenas algumas de que gostei mais, mas que muito possivelmente não irão para o DVD.


terça-feira, 17 de julho de 2012

Como arrancar erva daninha (Manifestação anti-Relvas, 17 de Julho 2012, Lisboa)

 Ontem, várias centenas de pessoas reuniram-se em frente à Assembleia da República para exigir a demissão do ministro Miguel Relvas.

 Entre ontem e hoje já ouvi vários comentário do género "Bah. Com tanta coisa para se manifestarem, pra qué que se vão manifestar contra aquele tipo?"

 Bom, e eu pergunto, "com tanta coisa para se manifestarem, porque é que não se manifestam?".

 Os vários casos em que está envolvido o ministro Miguel Relvas são apenas a ponta de um enorme icebergue de corrupção, favoritismos e interesses variados que não servem o bem-estar do povo que o sustenta.
 Miguel Relvas até pode não ser a erva daninha mais podre entre os legumes decrépitos instalados na assembleia, mas neste momento é sem dúvida a mais saliente. E agora que está à vista de todos esta é a melhor altura para a arrancar.


segunda-feira, 16 de julho de 2012

Para ver o que está do outro lado

 Hoje li que a lua é tóxica. Ou melhor, que o pó lunar é altamente nocivo para os pulmões, pele e olhos.

Os autores do estudo que levou a esta conclusão realçam que só uma investigação levada a cabo no local poderá completar as lacunas no que se sabe sobre a toxicidade da lua. Pessoalmente, tenho receio que esta seja mais uma "desculpa" para que não se volte a explorar o grande satélite nem o espaço além do mesmo.

Há poucos dias atrás tirei estas fotos do reflexo na pintura de uma Renault 4L e, ao olhar para elas, a minha mente foi invadida por imagens de astronautas, cosmonautas e taikonautas a trabalhar numa base lunar. Uma estação espacial a servir de base de lançamento para viagens interplanetárias, com enormes retro-escavadoras a recolher pó lunar para depois o utilizar como combustível...

Parece-me estranho que apenas 8 anos depois do aparecimento da 4L (em 1961), o homem tenha dado os primeiros passos na lua. Ou seja, na mesma altura em que os automóveis mais avançados não passavam de paralelepípedos de metal com quatro rodas, um motor e um volante, uma mão cheia de homens conseguiu alcançar o impossível.

Hoje, por outro lado, com tantos avanços, parece que perdemos a coragem de calçar as botas e de escalar a montanha para ver o que está do outro lado. Em vez disso, enviamos uma sonda, fazemos alguns cálculos no computador, click, click, click, vzzzz, prrrr.... Plim! Temos a resposta.

Hoje as grandes descobertas são feitas por tipos sentados em cadeiras confortáveis.

Tenho saudades da altura em que as grandes descobertas eram feitas por tipos sentados em canoas ou em camelos. Uma época em que três tipos viajavam à lua numa cápsula do tamanho de um VW Carocha projectada para o espaço no topo de um enorme míssil alimentado por várias toneladas de explosivos.

Só para ver o que está do outro lado...


P.S. - No momento em que acabei de escrever este texto, um dente de leão entrou pela janela e poisou na minha mão (a propósito de viajantes). Não tinha a máquina perto de mim, mas aqui fica uma foto tirada com o telemóvel.


sexta-feira, 13 de julho de 2012

Casimiro, caçador de monstros

Este é mais um dos segredos escondidos de Lisboa. Tal como a ponte de luz que aparece por breves momentos ao final do dia, este candeeiro-sombra que fotografei no Castelo de São Jorge também só é visível em momentos muito especiais.

Se o encontrarem, esperem um pouco e pode ser que vejam o fantasma de Casimiro Leão Guerreiro a aproximar-se, retirar um frasco de whisky do bolso da gabardina e beber um trago antes de revelar um revolver na mão direita e desaparecer.

Nascido entre séculos, no momento em que o relógio batia as 12 badaladas do início do dia 1 de Janeiro de 1900, Casimiro cresceu para se tornar um indivíduo extraordinário, capaz de feitos incríveis e protagonista das mais inacreditáveis aventuras. Poderia dizer-se que Casimiro era um detective, mas não um detective comum. Na verdade, era conhecido em Lisboa pelo nome apropriado de "Caçador de Monstros" pois a sua especialidade era precisamente encontrar, perseguir e aprisionar ou matar os seres demoníacos que infestavam os subterrâneos da cidade naquela altura.

Um dos clientes mais regulares de Casimiro era a Maçonaria Portuguesa, mais especificamente os representantes do Grande Oriente Lusitano. Certo dia, em Maio de 1931, Casimiro desvendou um plano dos maçons para terminar de vez com os demónios, monstros e aparições que assombravam a cidade. Um plano que o Grão-Mestre da Maçonaria apelidou de "a solução final".

No entanto, a grande solução iria terminar não só com os indesejados, mas também com toda a magia de Lisboa. Os corvos falantes, as pontes de luz, os navios espaciais, os golfinhos voadores, as árvores anciãs... todos iriam desaparecer. Para isso acontecer, era necessário que a população deixasse de acreditar na sua existência e, para isso, seria necessário que todos pensassem da mesma maneira.

...programação mental massiva...

Chocado com a descoberta deste plano maquiavélico, Casimiro dirigiu-se de imediato ao Grémio Lusitano, sede da organização maçónica, determinado a destruir os esquemas do Grão-Mestre. Ele sabia que provavelmente seria a derradeira noite em que poderia percorrer as ruas da cidade que tanto amava, mas a sua determinação era inexorável.

Casimiro bebeu um último trago de whisky, retirou o seu revolver do bolso e atravessou a entrada do Grémio Lusitano para nunca mais ser visto.

É quase certo que o detective morreu naquela noite e que os monstros desapareceram da cidade. Mas também é evidente que Casimiro conseguiu interferir de certa forma na "solução final".

É por isso que ainda hoje se vislumbram alguns vestígios de magia.

É por isso que por vezes se consegue ver o fantasma de Casimiro a a passear pelas ruas de Lisboa.

É por isso que a luz da nossa cidade continua diferente de todas as outras.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

"Ó Coelho! Sai da Troika!" (Manifestação de professores - 12 de Julho 2012, Lisboa)

 Os professores voltaram a concentrar-se no Rossio esta tarde para mais uma marcha até S. Bento contra as políticas pró-desemprego do actual governo. É difícil saber se estas manifestações têm algum impacto, mas os professores não podem (nem devem) deixar de lutar por melhores condições de trabalho (e por "trabalho" eu refiro-me a tudo o que a ele está associado, como estabilidade, formação, liberdade de pensamento, etc.).

 Como não poderia deixar de ser, o ministro José Relvas esteve na mira de muitas das frases escritas nos cartazes transportados pelos manifestantes. Por exemplo:

- "Professores para quê? Formação à Relvas é que está a dar!" (na fotografia)

Um pouco mais à frente, um grupo de professores cantava o clássico infantil "Joana come a papa", mas com a letra alterada para: "Sai da Troika! Coelho sai da Troika!"
Talvez um dia os senhores eleitos por nós percebam que a educação e a cultura são os verdadeiros impulsionadores da inovação. Talvez percebam que sem conhecimento nem criatividade não existe evolução, apenas estagnação.

quarta-feira, 11 de julho de 2012

Aníbal, o micróbio

Há dois ou três dias atrás, estava eu tranquilamente a pensar na morte da bezerra quando, de repente, fui violentamente agredido por um espirro traiçoeiro. O vilão aproximou-se de mim na calada da tarde e atacou-me impiedosamente com uma gigantesca marreta.

Naturalmente, isso fez com que deixasse de pensar na morte da bezerra (que aliás já morreu tantas vezes na cabeça de tanta gente que já ninguém lhe liga nenhuma). Em vez disso, comecei a pensar sobre o que se passa dentro dos nossos narizes. E foi aí que me lembrei da história de Aníbal, o micróbio directório.

Aníbal era um micróbio que não tinha uma função muito bem definida na comunidade microbiótica em que vivia (no interior de um humano qualquer). Ele tinha no entanto amigos nos mais altos níveis da sociedade e, como tal, era igualmente considerado um micróbio de prestígio. Ora bem, como figura de prestígio que era, não tardou a que Aníbal fosse nomeado para uma posição equivalentemente prestigiante: a de Director do Nariz.

Aníbal queria ser um grande líder e pensou "para ser um grande líder é necessário ser respeitado; para se ser respeitado é necessário ser temido; para se ser temido é necessário criar dúvida e incerteza; e, acima de tudo, é necessário que ninguém perceba que o líder não faz ideia o que está a fazer". Seguindo esta lógica inquestionável, Aníbal tratou rapidamente de emitir as suas primeiras ordens através dos fiéis súbditos que ocupavam agora vários postos hierárquicos que criou especialmente para o servirem:

"Por decisão da administração e do Sr. Prof. Dr. Director do Nariz, Aníbal Micróbio, foi determinado que:

1 - A partir da próxima terça-feira, os funcionários da narina esquerda deverão fazer o pino sempre que o Exm.º Sr. Prof. Dr. Director entre no edifício, excepto às segundas-feiras à tarde;

2 - A partir da próxima terça-feira, os funcionário da narina direita deverão cantar o primeiro acto do Barbeiro de Sevilha todas as manhãs, mas apenas até ao distinto Sr. Prof. Dr. Director sair da casa de banho;

3 - A partir da próxima terça-feira, as Fossas Nasais passarão a chamar-se Poços Nasais. Porque sim.

4 - Na próxima terça-feira será feita uma intervenção no sentido de acolchoar as paredes das Narinas Esquerda e Direita para maior conforto dos convidados do ilustre Sr. Prof. Dr. Director."


Durante vários dias, os funcionários do nariz deram o seu melhor para corresponder às exigências do seu novo líder.

Mas um nariz é um nariz. E um nariz faz o que um nariz faz. A confusão causada pelas novas directrizes causaram comichão e, com um valente espirro,  Aníbal e os seus fiéis súbditos foram projectados para a imensidão branca e luminosa de um lenço de papel.

Fim.

P.S. - Sei que a imagem tem pouco ou nada a haver com a história de Aníbal,o micróbio. Mas como devem calcular não é fácil fotografar micróbios (são muito tímidos, os tipos). Tirei a foto esta manhã no Monte Estoril.

terça-feira, 10 de julho de 2012

Árvore Rorschach

Os leitores mais astutos são capazes de ter reparado que a Esfera de Sonhos tem rolado pouco nos últimos dias. Bom, ao escrever "rolado pouco" estou a ser demasiado generoso comigo próprio. Na verdade, não ponho nada no blogue há 10 dias.

Mas há duas boas razões para esse encerramento provisório: primeiro por espirros (generosamente cedidos pelo habitual ataque de rinite alérgica de início de verão) e depois... por uma boa dose de preguiça (levemente temperada com uma pitada de "insegurança" e de "crise criativa").

Mas agora que esses empecilhos já estão (parcialmente) ultrapassados, vamos a ver se não deixo a Esfera de Sonhos voltar a parar.

Por agora deixo-vos com um foto tirada no Cais do Sodré, junto à EMSA (European Maritime Safety Agency).

Gosto da sombra da árvore no chão. Parece um teste de Rorschach.